domingo, 4 de dezembro de 2011

A questão Tibetana - o quê temos a ver com isso?


Imagine estar no ensino médio mais uma vez. Dois de seus bons amigos estão lutando e você é convidado a escolher um lado. Um deles é moralmente mais elevado, mas o outro ajuda você com as suas contas, e tem uma arma. O que você faria? Decisão difícil, certo? Em termos geopolíticos, o Nepal é esse amigo malfadado preso entre as disputas entre o Tibete e a China. E se a geopolítica não tivesse consequências na vida real, isso, de uma forma estranha, seria engraçado.
 
Enfrentar a questão do Tibete de forma sensata tem sido um grande desafio para o Nepal. A fronteira relativamente porosa do Nepal e o laço acolhedor com o Tibete quando contrastado com o compromisso do Nepal para a "política de unicidade da China" complica a situação. No entanto, o seu zelo para estar de bem com a China levou-o a reprimir qualquer tipo de movimento de solidariedade ao
Tibete dentro de suas fronteiras, que os rotulasse de "anti-China". neste mês 60 ativistas tibetanos foram detidos por demonstrar apoio aos monges budistas que atearam fogo a si próprios em protesto contra o domínio chinês no Tibete. Enquanto  Pequim elogia o Nepal por  sua"posição firme sobre questões relacionadas com o Tibete" , a comunidade tibetana Nepalense, e os defensores dos direitos humanos de todo o mundo protestam.

O apoio Nepalense à "política de unicidade da China" se justifica pela realidade geoestratégica na região. Estando prensado entre dois gigantes, faz sentido pacificar os interesses dos nossos vizinhos, especialmente do maior que nos presta ajuda e cuja amizade nos promete um futuro melhor. A China tem sido um bom amigo para o Nepal. O aumento do interesse chinês pelo Nepal pode ser constatado pelo aumento do nível de ajuda, o número mais elevado de delegações que envia, os investimentos que estão sendo feitos, e os múltiplos projetos de desenvolvimento em curso. É compreensivel querer-se algo em troca. A China quer contrapor-se a influência indiana, e quer eliminar qualquer atividade anti-China dentro de nossa fronteira. Até agora temos feito o suficiente para agradá-los. Mas a que custo? Onde termina a amizade e começa um servantilismo?

É difícil até mesmo definir o que constitui uma atividade anti-China. Manifestações contra violações dos direitos humanos por parte do Estado chinês são anti-China, ou pró-direitos humanos? Acenar com uma bandeira tibetana no Nepal é anti-China, ou é a liberdade de expressão garantida pela nossa Constituição? muito poucas pessoas no mundo que realisticamente acreditam que o Tibete pode ser completamente independente da China, incluindo Sua Santidade o Dalai Lama. Acenar e cantar com a bandeira "Free Tibet" em grande parte se refere a libertar o Tibete da opressão política, cultural e ambiental. "Free Tibet" é mais uma questão de direitos humanos do que política - Pequim deve perceber isso.

A questão do Tibet é tanto sobre o Nepal quanto é sobre o Tibete. Esta questão é um ponto de referência da nossa democracia. A questão é sobre nossas liberdades civis. É sobre ser uma sociedade que não se coíbe em discutir as preocupações difíceis só porque elas são difíceis. Até onde eu sei: enquanto no Nepal se alguém - cidadão ou não - quer protestar sobre qualquer questão que  os incomode, devemos conceder-lhes o privilégio. Isso é o que as sociedades livres fazem, que é o que fazemos em todas as outras situações.

Para ser justo, o Nepal não tem sido completamente unilateral. O Nepal permite que os 30.000 refugiados tibetanos frequentem escolas onde se fala a língua tibetana, e dé assistência aos necessitados na diáspora. Além disso, parou de enviar exilados tibetanos de volta a Pequim. Recentemente, quando o governo do Nepal ordenou a deportação de 23 refugiados, a Suprema Corte anulou a decisão.

A verdade é que o Nepal não pode suprimir a força da
ira do Tibete contra a China para sempre. um apoio muito maior para a questão entre os moradores do Nepal e os nossos amigos no Ocidente. Devemos acordar para essa realidade! O que o Nepal precisa fazer, e espero que o faça bem, é ser um mediador. É realmente uma decisão difícil, mas devemos a nossos queridos amigos tibetanos, pelo menos, uma tentativa em seu favor.


Levante-se, tome nota!

As bandeiras nas cores amarelo, vermelho e branco estavam vibrando no ar, em frente ao escritório da ONU em Pulchowk. As pessoas gritavam "Free Tibet". Pronto para enfrentá-los havia uma horda de policiais com capacetes e escudos de vidro, de pé a poucos metros de distância. Eu podia ver a diferença entre os dois grupos. De onde eu estava olhando, do lado direito estavam pessoas desarmadas (eu não tenho certeza se bandeiras, tibetanas para ser mais específico, contam como armas) e à esquerda estavam pessoas armadas com porretes e pistolas de gás prontos e ansiosos para seguir as ordens estritas de "avante" para conter o protesto e espancar alguém vindo em sua direção.

Em pouco tempo, as dezenas de homens, mulheres e até mesmo os alunos da escola que protestavam foram espancados, forçosamente arrastados e jogados no camburão. A van logo partiu com todos os manifestantes que estavam apenas reivindicando seus direitos, da forma mais pacífica que você jamais poderia imaginar.

Um amigo meu e sua mãe estavam entre os que desembarcaram na cadeia.

É claro que não foi a primeira vez que eu estava experimentando um tal incidente que as notícias e fotos relacionadas com a questão tibetana foram muitas vezes publicadas nos principais meios de comunicação internacionais e alguns nacionais. Eu tenho muitos amigos tibetanos que vejo em tanta desolação, nestes tempos em que não podem viver em seu próprio país e que o país onde vivem não quer tê-los. De nenhuma maneira eu seria tão incansável e pacífico como eles são se eu fosse forçado a deixar o meu país. Eles me ensinaram muito sobre viver a vida e apreciá-la seja como for e nunca perder a esperança.

A maioria dos meus amigos tibetanos nasceram no Nepal após 1990, não são reconhecidos como refugiados pelo governo do Nepal e, portanto, não possuem quaisquer documentos ou cartões de identidade (RCs) e são automaticamente desqualificados para o pouco de liberdade que é dada aos que são  'reconhecidos' como refugiados. Eles são considerados imigrantes ilegais e estão sujeitos a perseguição e deportação para a China a qualquer momento. Este pensamento me deixa extremamente ansioso. E se de repente um dos meus amigos for negada a educação ou o emprego? E se um deles desaparecer de repente? E se forem deportados de volta para a China como tantos outros? Quem é que vai ser responsável por isso?
 
É uma vergonha que a política do nosso próprio governo teimam em destruir a identidade do Tibete, silencie suas vozes para sempre e quebre os dedos que são erguidos em desafio. Isto só faz com que a sua feroz determinação e sua vontade de continuar se torne mais forte.

Uma luta, uma batalha nunca é fácil. Mas a que foi travada sem regras no país de outros, que não tem forma, nem estratégias concretas, apenas como um pequeno feixe de esperança para um final pacífico, se é que vai haver, está muito além de nossa imaginação e ainda assim isso é o que exatamente está acontecendo aqui, na nossa própria nação.
 
Meu coração está com os incontáveis tibetanos, que perderam suas vidas, seu país, sua identidade, mas não o sonho de voltar para onde tudo começou. Eu sempre os assisti lutando por seus direitos, entorpecido, mas agora há uma sensação ardente crescendo dentro de mim, dizendo: chegou a hora de também fazer a minha parte, erguendo-me e protestando pelos direitos de todos a protestar pacificamente.  Eu já fui covarde o suficiente. E você?

Sumati Maharjan


Tradução livre de Jeanne Pilli

http://www.wavemag.com.np/issue/article3897.html

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